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O PROJETO "CULTURA PENSANTE"

O projeto "Cultura Pensante" é um movimento criado por integrantes do Centro Acadêmico de Filosofia (CAFIL) do Campus Chapecó da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), vinculando-se a este órgão representativo, com o objetivo de criar e divulgar cultura.  O projeto engloba, de um lado, a criação e divulgação e atividades culturais, e, de outro, a divulgação a um público externo da síntese dos conhecimentos construídos pelo projeto por meio da revista digital sediada nesse espaço.

O projeto “Cultura Pensante” é voltado à interação e divulgação das produções e dos conhecimentos que habitam o mundo acadêmico e seu encontro com a cultura geral que emerge da vida social. Primeiramente, dentro do próprio cotidiano universitário, o projeto visa, através das atividades, trazer um meio de relacionar o cotidiano acadêmico com atividades e conhecimentos artístico-culturais, cuja carência é evidenciada na região do oeste catarinense, na qual existem poucas oportunidades de interação artística próximas da universidade. Espera-­se, através deste projeto, contribuir minimamente para tornar o meio acadêmico um espaço capaz de integrar arte e cultura, trazendo a oportunidade de uma pluralidade cultural abrangente aos acadêmicos, técnicos e professores doCampus Chapecó da UFFS.

A revista "Cultura Pensante", é o mecanismo de divulgação, análise e reconstrução dos conhecimentos construidos por estas atividades. Encontrar-se-á neste espaço uma síntese de todos os conhecimentos construídos e divulgados no projeto. Além de também dar a oportunidade a todos de publicarem os próprios textos e o resultado de seu estudo acadêmico.

O processo será realizado pensando-­se sempre na interação entre universidade e sociedade, construindo suas atividades de maneira dialogada, que torna possível aproveitar do melhor de cada uma das partes envolvidas, seja pela universidade ou pelos diversos setores da sociedade. Quanto à comunidade externa, espera-­se o envolvimento espontâneo de quem estiver interessado em atividades artísticas, filosóficas ou culturais. Porém, apesar dessa abertura a todos os setores da sociedade em geral, têm­-se em vista alguns públicos em especial. Espera­-se a interação com as escolas, sejam privadas ou públicas, em todos os níveis de ensino, como meio de um primeiro contato dos alunos com a universidade. Ademais, os acadêmicos das licenciaturas podem, através dessa aproximação, dar os primeiros passos sobre o prendizado do convívio e da relação com os alunos das escolas. Os professores colaboradores do programa das redes de ensino podem contribuir com diversas formas de relatos de experiência, além de poderem contribuir às suas próprias aulas com as atividades. Artistas e professores das escolas de artes são bem­-vindos e incentivados a fazerem parte do programa e dos eventos, pois pretende­-se mostrar a filosofia, a arte e a cultura em vivacidade,sendo aplicadas e construídas.

Além disso, as atividades desenvolvidas pode servir como meio de expressão política, artística ou social em todas as suas formas possíveis, algo que falta ao cotidiano acadêmico e ao oeste de Santa Catarina como um todo, que carece de mídias alternativas que podem oferecer uma

pluralidade de concepções políticas e filosóficas dos acontecimentos e das questões em voga na sociedade. Assim, é possível enriquecer a cultura e a informação na história sendo feita hoje.

Justificativa e objetivos
Filosofia e cultura

A partir de Edward Burnett Tylor, temos que “Cultura ou civilização, tomada em seu sentido etnográfico, é todo aquele complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, lei, costume e qualquer outra capacidade e hábito adquirido pelo homem como membro de uma sociedade” (TYLOR, 1920, p. 1). Esta primeira conceituação de cultura moderna, como fundamento da antropologia, expressa em parte o que o programa busca: explorar as diferentes formas de expressão de cultura, em suas diferentes particularidades e pluralidades. Apesar desta conceituação contemporânea, a filosofia sempre teve o que hoje assim conceituamos como item importante ao aprendizado. Podemos ir além e afirmar que não há filosofar sem cultura. Filósofos, desde a antiguidade, relacionaram a cultura ou alguma das artes com a educação, até mesmo a educação filosófica: “Além disso, aqueles muito capazes em Filosofia, tal como Platão, dizem que o sábio é semelhante ao músico, pois tem a sua alma harmonizada.” (EMPÍRICO, S., M VI, 13). Platão, em sua República, tem o aprendizado da música como item essencial à educação dos guardiões. E, para Sócrates, um aprendizado que aos sábios não há tempo específico: “Assim, do mesmo modo, Sócrates, embora já estivesse muito velho, não se envergonhava de recorrer a Lámpon, o citarista, e, para alguém que o repreendeu, ele disse que é melhor ser acusado de aprendiz tardio do que de ignorante” (EMPÍRICO, S., M VI, 13). Até mesmo para os adeptos do ceticismo antigo, ainda que grandes críticos da filosofia e dos modelos de educação pretendidos pelos filósofos dogmáticos de sua época — que eram, segundo eles, inúteis —, a cultura era não apenas importante, mas necessária: o conhecimento de outras culturas era essencial para livrar-­se do dogmatismo. Os renomados tropos céticos, i.e., argumentos para a suspensão do juízo sobre a natureza intrínseca das coisas, baseavam-­se em muitos momentos na diversidade cultural, mostrando que não havia critério para a supremacia ou preferência de uma cultura em detrimento de outra. Brochard (2009) mostra que as viagens para outros lugares e conhecimentos de outras culturas, em sua diversidade de costumes e religiões, são escolas de ceticismo.

A descoberta do novo mundo, e, com esta, das novas culturas dos povos da América, causou um impacto extraordinário no contexto filosófico da modernidade. As discussões sobre a natureza humana, que levavam em conta apenas uma generalidade de povos conhecidos pelos europeus, tiveram de ser revistas. Sobre os americanos, “[...] não vejo nada de bárbaro ou selvagem no que dizem daqueles povos; e, na verdade, cada qual considera bárbaro o que não se pratica em sua terra” (MONTAIGNE, Michel de, 1987, p. 101). Montaigne não deixou-­se levar por qualquer “superioridade” autoatribuída aos europeus, e ressaltou, com tom de maravilhamento, os detalhes de suas condições de vida, moradia e relações sociais entre si e com os outros povos nativos, além de suas crenças religiosas ou mitológicas. A antropologia filosófica transformou-­se, e o próprio filosofar a partir de então foi outro. Descartes tem o conhecimento das diferentes culturas como item essencial para o seu método de filosofar, pois, por meio deles “[...] aprendi a não acreditar com demasiada convicção em nada do que me havia sido inculcado só pelo exemplo e pelo hábito; e, dessa maneira, pouco a pouco, livrei­-me de muitos enganos que ofuscam a nossa razão e nos tornam menos capazes de ouvir a razão” (DESCARTES, René, 1999, p. 42). Quanto à educação, o mesmo filósofo sabia “[...] que a gentileza das fábulas estimula o espírito; que as realizações notáveis da história o fazem crescer, e que, sendo lidas com descrição, ajudam a formar o juízo; que a leitura de todos os bons livros é igual a uma conversação com as pessoas mais qualificadas dos séculos passados” (DESCARTES, René, 1999, p. 38); e ainda que “É bom saber alguma coisa dos hábitos os diferentes povos, para que julguemos os nossos mais justamente e não pensemos que tudo quanto é diferente dos nossos costumes é ridículo e contrário à razão, como soem fazer os que nada viram” (DESCARTES, René, 1999, p. 39).

Na filosofia, temos até exageros na defesa da cultura aliada ao ensino. Nietzsche, em seu Crepúsculo dos Ídolos, deixa claro o seu exagerado apego à cultura no meio educacional: “o essencial no ensino superior da Alemanha está perdido, tanto quanto ao fim como quanto aos meios que põem em prática para obtê­lo. Que a educação e a própria cultura sejam o fim — e não o império”. (NIETZSCHE, 2001, p. 52). Nietzsche tem a cultura, em sua riqueza intrínseca, em contrariedade à “cultura” que o estado alemão quer criar: “O que as escolas superiores sabem fazer efetivamente é um adestramento brutal a fim de tornar útil e explorável ao serviço do Estado uma legião de jovens no tempo mais curto possível.” (NIETZSCHE, 2001, p. 52). Este grande filósofo, porém, tem na massificação e na democratização do ensino da cultura uma crítica destrutiva, e não buscamos por este projeto uma aristocratização da cultura como propõe Nietzsche à Alemanha de seu tempo. Queremos que, pelo contrário, todas as formas de cultura sejam valorizadas, e que todos os indivíduos, motivados apenas pela elogiável vontade do saber, tenham acesso e gozo de toda a cultura possível.

Compreende-­se que o processo só pode ser realizado de uma maneira plural, democrática e inclusiva. Entendemos que, se queremos a cultura com vivacidade, sendo construída, e que tenhamos possibilidade de fazer parte deste processo, o único modo para assim realizar é agregar o maior número de pessoas e a maior diversidade possível de opiniões, costumes, credos, vivências e formas de arte. A única maneira de conhecermos a cultura de hoje é aproximando a universidade de toda a sociedade. Vemos que, por toda a história da filosofia, o estudo das culturas foi um complemento da atividade filosófica. A arte e a cultura são alguns dos itens necessários ao filosofar. As culturas transformaram a filosofia, deram-­lhe novos problemas. E nosso princípio é batalhar para que esta fonte não se esgote.

Referências Bibliográficas:

BROCHARD, Victor. Os céticos Gregos. São Paulo: Odysseus Editora, 2009. Tradução de Jaimir Conte.

DESCARTES, René. Discurso do Método. In: DESCARTES, René. Descartes. São Paulo: Nova Cultural, 1999. p. 33­100. (Os Pensadores). Tradução de

Enrico Corvisieri.

MONTAIGNE, Michel de. Ensaios: Volume I. 4. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987. (Coleção Os Pensadores). Tradução de Sérgio Milliet.

NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. O CREPÚSCULO DOS ÍDOLOS: ou A FILOSOFIA A GOLPES DE MARTELO. Curitiba: Hemus, 2001. Tradução de

Edson Bini Márcio Pugliesi.

ROEDER, Sarah. O CONTRA OS MÚSICOS DE SEXTO EMPÍRICO: INTRODUÇÃO, TRADUÇÃO E COMENTÁRIOS. 2014. 134 f. Dissertação

(Mestrado) ­ Curso de Música, Departamento de Música, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014.

SOUSA, Ana Luiza Lima. A história da extensão universitária. Campinas: Alínea, 2000, p. 98.

TYLOR, Edward Burnett. Primitive culture: researches into the development of mythology, philosophy, religion, language, art, and custom. London: Murray,1920. Disponível em: <https://archive.org/details/primitiveculture01tylouoft>. Acesso em: 23 jul. 2016.

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